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domingo, 11 de maio de 2014

Um Feliz Dia das Mães


Eu tenho acompanhado, sempre que posso, o programa Santa Ajuda, do GNT, já que adoro dicas de decoração e organização. Então, esta semana tive uma boa surpresa: em plena semana do Dia das Mães, o programa traz a organização de um quarto de bebê para um casal que espera o primeiro filho. Nada demais se esse casal não fosse composto por duas mães. Foi muito interessante observar a naturalidade do discurso de uma nova configuração familiar, coisa que até dez anos — sim, somente dez anos — seria impossível. Mas por que falo disso hoje? Porque, em meio a mil postagens fofas no Facebook de homenagem às mães, me pergunto se as pessoas realmente conseguem perceber o que é a maternidade. Sim, as mães são dos seres mais importantes deste mundo, porque sem elas não estaríamos aqui. Elas geram, cuidam, alimentam, protegem. Em sua maioria. Mas nem sempre. Porque há mães que são mães por acidente, por obrigação, por falta de escolha, por imposição social. E há aquelas que, apesar de amarem seus filhos, depois de tê-los e perceberem a tarefa hercúlea que empreenderam, se pudessem escolher novamente escolheriam não ser mães. Conheço algumas. E isso não é nenhum demérito. Porque mães não são supermulheres. São seres humanos, e como tal passíveis de erros, arrependimentos, mágoas, medos. Acima de tudo são mulheres que desde que o mundo é mundo sofrem a pesada imposição social de que é natural ser mãe, desejar ser mãe, sendo, na verdade, quase uma obrigação.
Há algum tempo, uma médica me disse que, com meu relógio biológico apitando, eu deveria pensar em ter filhos, pois poderia me arrepender de não tê-los depois. Ao que eu retruquei que quem garantiria que não me arrependeria de tê-los. Não satisfeita, me disse que eu poderia me arrepender quando, com 60 anos, me encontrasse sozinha. Fiquei escandalizada como, em plena década de quase 20 do século XXI, havia mulheres que colocavam seres no mundo para garantir sua não solidão. Que egoísmo é esse? Dei graças a Deus, depois de me recuperar da pressão absurda, por ser lúcida e não pensar assim.
Porque filhos são gente. Mães são gente. E pais são gente. Família pode ser o melhor lugar do mundo, como também pode ser o inferno na Terra. Somos seres humanos, e como tal podemos ser maravilhosos e cometer erros sem gravidade emocional absurda, mas também podemos estragar o psicológico de uma criança que está tentando se entender neste mundo de cão. Por falta de amor, muitas vezes não pela criança, mas por si mesmas, algumas mães não são boas mães, definitivamente. E na maior parte dos casos não têm culpa disso. Simplesmente repetem um padrão passado por gerações.
Quando comecei o post falando do programa sobre a maternidade do casal homossexual, quis centrá-lo no amor. Na maternidade como escolha, não como vocação. Como desejo, não como obrigação social ou biológica. O discurso sobre a constituição familiar básica com pai, mãe e filhos está sendo alterado aos poucos, dando lugar a uma nova configuração. Daqui a pouco tempo não será estranho vermos as várias configurações de família, o que mostra que o discurso constrói, sim, o social. Como foi mostrado exaustivamente por Michel Foucault com sua "arqueologia do saber": o discurso constrói o social, muda comportamentos, estabelece várias ações, muda conceitos. Isso tudo sem nos darmos conta disso. É assim que o amor homossexual está começando a ser visto com os olhos com que devem ser vistos: com olhos de amor. E espero que aos poucos isso aconteça também com o olhar para as mães. Que as retiremos do pedestal em que sempre foram colocadas em toda a existência da humanidade e que as tragamos para o lugar que devem ocupar: como mais uma escolha feminina, como qualquer outra: a de trabalhar ou não, pintar o cabelo ou não, casar-se ou não, ser mãe ou não. Porque ser mãe não é intrínseco ao ser. É uma responsabilidade que deve ser assumida com consciência. Não porque se é mulher, porque o marido/companheiro quer, porque a sociedade exige, porque se tem medo de ficar sozinha. Você trará um filho ao mundo e deverá dar conta a esse mundo do que fez dele. Porque seu filho crescerá e fará as próprias escolhas, mas só estará aqui para fazê-las porque você assim o permitiu.
Então, neste Dia das Mães desejo a todas as mulheres que empreenderam esse caminho que o façam da melhor maneira possível, sem esquecer que são humanas. Aos filhos das mães, que as vejam como seres passíveis de erros e que saibam se afastar de suas mães caso elas sejam nocivas a si mesmos, e amá-las e agradecer-lhes caso elas sejam amorosas e companheiras. E desejo a todas as mulheres que estão na dúvida se trilham ou não esse caminho que o façam com consciência. Sobretudo isto: pensem, em primeiro lugar, em si mesmas. Porque ser mãe é abrir mão de si mesma em muitos pontos, nem que seja emprestando seu corpo para gerar outro ser. Essa pode ser a maior aventura da sua vida, mas também pode ser a pior, vindo com culpa e arrependimento. Porque um filho, uma vez estando no mundo, vai lhe cobrar o papel de mãe, e você precisa estar consciente desse papel. Então, um conselho: se existe uma dúvida grande sobre ele, não o aceite. Porque você, mulher, pode ser ou não mãe em nosso tempo atual, mas será sempre uma mulher. E mulher tem a maternidade dentro de si, que pode ser canalizada para um sobrinho, um trabalho com crianças, uma ajuda a terceiros. Não é egoísmo. Egoísmo é colocar filho no mundo para aplacar sua solidão. Lembre-se: os filhos não são seus, são do mundo, e para isso devem ser criados.
Um Feliz Dia das Mães a todas que o são. E às que escolheram não serem, um Feliz Dia das Mães às suas mães. E parabéns pela sua coragem de dizer não.

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