Acho que tenho vontade de escrever cartas porque elas levam um tempo. Tempo para ser escritas, para ser enviadas (e aí você pode realmente decidir se quer enviá-las ou não), para chegar ao destino. E aí tem mais aquele tempo de saber se o destinatário leu, gostou, e aí novamente o tempo de resposta.
Numa carta, dava para perceber a mudança da letra em um momento ou outro: a redondinha e bem escrita do início, quando ainda estamos começando, e a mais largada do fim, quando já estamos cansados e o punho começa a doer. Também é possível desenhar nas margens: coraçõezinhos, solzinhos, nuvenzinhas. E podemos perfumar o papel, caso queiramos que vá junto com nossa letra algo mais: o nosso cheiro.
Adoro os meios modernos de comunicação. Adoro receber e-mails, SMS de bons-dias, mensagens no WhatsApp, recados nas redes sociais... Mas a carta guardava algo de mais pessoal, porque guardava o tempo, o aconchego, a suspensão... tudo isso que é muito humano.
Há diversos filmes que falam sobre as relações por correspondência, amorosas ou não. Um deles é A casa do lago, em que um homem e uma mulher, separados no tempo de dois anos, conseguem se corresponder e se conhecer. Em uma das cenas, ela está sentada lhe escrevendo quando sabe da morte do pai dele. Pela impossibilidade do telefonema, o texto se transforma num carinho feito pela escrita, em que ela diz que gostaria de estar ali, com ele, e olhar o lago da casa que seu pai havia construído para sua mãe. Dá para sentir o abraço que se transforma num refúgio de segurança, dá para sentir o apoio, porque há calor.
A outra cena se passa em Orgulho e preconceito, em que a personagem principal está sentada junto à janela a escrever. Ela olha pelo vidro, respira, pega a pena e, com traços bem delineados e vagarosamente, começa a carta endereçada à irmã: "Dear Jane". Sente-se o tempo da escrita, do pensar, do respirar. Há carinho, pausa, há momento de reflexão. Tudo isso numa manhã preguiçosa, em que não há nada mais a fazer a não ser falar com quem se ama.
As cartas guardavam o inusitado, a espera da esperança, a ansiedade. Elas tinham vida, porque havia ali um pedacinho daquele que escrevera.
Quero voltar a escrever cartas. Não porque escrever e-mails seja ruim, mas porque preciso desse tempo da pausa da caneta sobre o papel, do cuidado em dizer algo, porque não há como apagar.
Quero voltar a escrever cartas, e talvez elas levem consigo desenhos nas margens e um suave perfume nas folhas. Para que se lembrem de mim.
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